A Preciosa Guirlanda 02 – Cap. 2 As Dez Coisas Necessárias

O Texto

As dez coisas necessárias:

1. É necessário ser independente para que não se deixar levar por conselhos;

2. É necessário praticar com fé e diligência, de acordo com as instruções do santo lama;

3. É necessário selecionar as instruções do lama de maneira inequívoca, compreendo a distinção que há entre instruções apropriadas e inapropriadas.

4. É necessário desempenhar as instruções do lama com sabedoria, fé e diligência.

5. Utilizando-se da plena atenção (“mindfulness”), da vigilância e da prudência, é necessário conservar sem máculas o corpo a palavra e a mente.

6. É necessário ser estável e independente na prática, possuindo coragem e a armadura da diligência.

7. É necessário ser sem apego, sem se deixar levar facilmente pelos outros.

8. Utilizando a preparação, execução e conclusão, é necessário perseverar sem descanso na reunião das duas acumulações.

9. Com amor e compaixão, é necessário voltar a mente para a realização direta ou indireta do bem dos seres.

10. Unindo sabedoria, compreensão e realização, é necessário não se enganar, considerando os objetos do conhecimento como possuindo alguma substancialidade dotada de características próprias.

Essas são as dez coisas necessárias.

AS DEZ COISAS NECESSÁRIAS – COMENTÁRIOS KHENPO KARTHAR RIMPOCHE

Gampopa em seguida apresenta as dez coisas necessárias, para uma correta prática do dharma. A primeira delas constitui em manter o comprometimento à prática do dharma até a sua conclusão, seja de forma geral ou especifica, qual você esteja fazendo no momento.  Se você não possuir tal comprometimento, você facilmente será levado por opiniões, conselhos e conversa de outros, e acabará não concluindo aquilo que começou. Para manter um forte comprometimento, você deve saber com detalhes e precisão os pontos essenciais da pratica que esta fazendo. Esse comprometimento vai crescer ao considerarem-se as dez causas de lamentação.

A segunda coisa necessária é por meio da fé e diligência realizar as vontades e instruções do seu Lama. Fé é praticar e cumprir com satisfação, as instruções dadas pelo Lama, pelo fato de reconhecer os benefícios de fazê-la. Diligência é, com entusiasmo, realizar efetivamente as instruções dadas, na qual se tem confiança. Através desta forte fé e intensa diligência você é capaz de colocar as instruções do seu Lama realmente em prática.

A terceira coisa necessária é praticar perfeitamente, com habilidade e compreensão, as instruções do seu Lama. Embora as instruções não possuam defeito, a forma que você as emprega pode sim ser defeituosa.  Por exemplo, se você tentar praticar o mantra secreto, sem qualquer renúncia do samsara e sem ter gerado a bodhicitta, embora as instruções do mantra secreto sejam profundas e imaculadas, a sua prática será totalmente ineficaz e não gerará qualidade alguma. Por isso é importante colocar o dharma em prática com habilidade, e com a compreensão da sua sequencia correta.

A quarta coisa necessária é preservar na prática uma forte confiança nos Ensinamentos e a visão correta sobre os seus significados. Significa colocar as instruções do Lama em prática, sem confundir o seu significado, de acordo com as intenções do Lama de como deve ser realizada a pratica. Sherab ( ou prajna em sânscrito)- significa conhecimento transcendente – vem da perspectiva de que só através de uma visão (“insight”) inquisitiva sobre o significado das instruções que recebeu, você será capaz de pratica-las apropriadamente.

Além disso, essa pratica deve ser prolongada até você gerar a extensão das qualidades que o seu Lama possui, adquirindo a mesma realização que ele.  Pela fé inabalável ou confiança no valor e eficácia, você persevera na pratica. Então, a quarta coisa necessária é a perseverança correta na pratica através da visão e confiança.

A quinta coisa necessária a se manter inclui a plena atenção (“mindfulness”), a vigilância e prudência. Você deve estar consciente da conduta que deve ser adotada ou abandonada.  Você deve estar atento e alerta na medida empregada da atenção. Finalmente, a partir da plena atenção e vigilância, você deve ter o cuidado de reparar quaisquer falhas ou desvios.

Se você aplicar estas três qualidades, seu corpo, fala e mente serão puros dos defeitos de conduta defeituosa. Por outro lado, se você não tiver a plena atenção, você não vai lembrar-se do que deve ser adotada ou abandonada. Se não tiver a vigilância, nada em sua conduta lhe permitirá ver atentamente o que você está fazendo. Mesmo se você se lembrar do que deveria fazer, não será capaz de realizar, porque você está perdido.

Se não houver prudência, quando você começa a se perder na conduta com defeito, não terá maneira de trazê-la de volta, por não ter o hábito da atenção plena ao que você está fazendo.

O resultado da falta destas três qualidades são que seus votos e o samaya serão prejudicados. Portanto, antes de se reunir com os inimigos da distração, você deve cercar-se com a armadura da plena atenção, vigilância e prudência, de modo que quando você for “atacado” não será destruído.

A sexta coisa que é necessária também são compostas de três pontos: a armadura do comprometimento, a coragem e a estabilidade na prática. Através da armadura do comprometimento, você não renúncia o seu compromisso com a prática. Através da coragem, os obstáculos e problemas que surgem durante a vida ou durante a prática não afetam a você. Você não permite que esses obstáculos e problemas, o afastem da prática, faça-o desistir de praticar. Através do seu comprometimento e coragem, você cria uma estabilidade em sua prática que é inabalável e sem medo, e impede que você seja afastado da prática por força de circunstâncias inesperadas. Se você se permite ser desviado da prática pelo menor incidente que seja, por obstrução ou a sua interrupção então você é pior do que qualquer pessoa mundana. Pessoas em atividades mundanas têm grande paciência diante de interrupções e obstáculos. Portanto, é muito importante para os praticantes do dharma mostrarem o mesmo  comprometimento e coragem.

A sétima coisa necessária é estar livre do apego (chag may) e da ausência de vício (zhen may). A frase tibetana para este significado, literalmente; “não deixe o seu anel de nariz ser pego por outros”.  As vacas tem em seu nariz uma argola, para ser facilmente levadas, através de uma corda. Se você é livre de qualquer tipo de apego ou vício de lugares específicos, de pessoas, dos seus bens, de experiências prazerosas ​​dos cinco sentidos, ou de objetos desejáveis que possam ser experimentados pelos cinco sentidos, então você está no controle de si mesmo e ninguém pode controlá-lo. No entanto, ter apego às condições agradáveis ​​e situações particulares é o mesmo que ter uma argola no seu nariz, com uma corda amarrada, e na outra extremidade uma pessoa puxando, para onde quer que ela queira que você vá. Apenas quando você possui uma argola ao redor de sua própria cabeça, sem deixá-la sobre o controle de ninguém, é que você poderá praticar  o dharma.

A oitava coisa necessária é que sua prática deve ser abraçada pela tríplice excelência. A primeira das três excelências é a pura motivação. No início de qualquer sessão de prática deve-se gerar o pensamento ou intenção que por meio dessa prática todos os seres sencientes possam ser levados ao estado de Buda completo. A segunda excelência é que, durante o corpo principal da sessão, você mantenha sua mente em um estado livre de elaboração, livre de elaboração conceitual da prática. A terceira excelência é no final selar com a dedicatória, não somente pelo mérito acumulado da sessão, mas também pelo mérito acumulado por todos os seres sencientes dos três tempos: passado, presente e futuro. Todo mérito é dedicado para a liberação completa e onisciência de todos os seres. Se a sua prática é abraçada por essa tríplice Excelência no início, no meio e no fim, resultará na dupla acumulação de mérito e sabedoria. Através da motivação correta, meditação e dedicação, você terá acumulação de mérito. Marcando toda a prática com o selo da não conceitualização, que é livre de elaboração, você realizará a acumulação de sabedoria.

A nona coisa necessária é o firme desenvolvimento da bondade e compaixão, por meio do qual você beneficia outros em ambas as formas, direta e indireta. Bondade amorosa é a desejo de que todos os seres sencientes possam ter a felicidade e as causas da felicidade. Através da bondade amorosa, você se engaja na conduta, que é necessária, para trazer benefício direto, em curto prazo para os seres. Em longo prazo, de forma indireta, você faz as aspirações de que, por meio de sua prática, todos os seres sencientes possam vir a atingir a felicidade suprema do estado de Buda. A Compaixão é o desejo de que todos os seres sencientes fiquem livres do sofrimento e das causas do sofrimento. Com esta motivação, você beneficia os seres sencientes diretamente, liberando-os a partir de situações de sofrimento e, indiretamente, através da aspiração, que sua prática será a causa de liberação total do todos os sofrimentos do samsara.

A décima coisa necessária é por meio da aplicação do conhecimento ou insight (sherab), evitar o defeito de reificação. Consiste em primeiro lugar, compreender intelectualmente e, segundo, realizar ou adquirir a experiência direta, que todas as coisas que percebemos não possuem substancialidade e nem características inerentes. O primeiro é entender que todas as coisas que percebemos não passam de meras experiências; são, em si, apenas elaborações mentais ou fabricações. O segundo é a realização plena de que a verdadeira natureza ou modo de ser de todas as coisas é livre de elaboração, ou seja, livre de qualquer mácula que pudesse ser produzida por suas aparentes características.

Este texto está dividido em capítulos contendo dez itens cada, e nós já passamos pelos dois primeiros. Uma compreensão apropriada de cada capítulo depende da memória do anterior. O entendimento do segundo capítulo depende da compreensão do primeiro e conforme seguimos adiante nos próximos capítulos, se faz necessário o entendimento dos anteriores. Por exemplo, se você estudar uma dos capítulos do final do texto, eles não farão muito sentido caso se desconsidere o conteúdo do material que os precede. Portanto, peço que não se esqueçam desses dois primeiros capítulos contendo dez itens cada.