A Preciosa Guirlanda 12 – Cap 11 As dez confusões de uma coisa por outra

Essas são as dez confusões de uma coisa por outra.

1. Pode haver confusão entre fé e desejo.

2. Pode haver confusão entre amor-bondade e apego.

3. Pode haver confusão entre a essência da vacuidade e a vacuidade que é conceitualizada pelo intelecto.

4. Pode haver confusão entre dharmadhatu e a visão niilista.

5. Pode haver confusão entre simples experiência e realização.

6. Pode haver confusão entre praticantes que são realizados e aqueles com experiência relativa.

7. Pode haver confusão entre praticantes virtuosos e impostores.

8. Pode haver confusão entre sidhas e charlatões.

9. Pode haver confusão em beneficiar os outros e beneficiar a si próprio.

10. Pode haver confusão entre professores qualificados e enganadores.

AS DEZ CONFUSÕES DE UMA COISA COM OUTRA – COMENTÁRIOS DE KHENPO KARTHAR RIMPOCHE:

O Próximo capitulo são relacionados às dez situações em que se pode confundir uma coisa com outra. Refere-se a dez situações em que duas atitudes podem ser similares em aparência, mas são muito diferentes em seu efeito e natureza, e, portanto, podem facilmente ser confundidas uma pela outra.

A primeira delas é que é possível confundir a fé e o desejo. Quando você tem fé em alguém, isso é bom, é prazeroso. Quando você está pessoalmente ligado a alguém, você também se sente bem. É possível confundir uma coisa pela outra na sua atitude com seus professores. A fé nos professores é a valorização do fato de que através de sua realização, compreensão e compaixão, ensinam o caminho que conduz à liberação e onisciência. É um interesse neles e no que eles ensinam, um respeito por eles e pelo método.

Por outro lado, o apego, o desejo, ou a fixação pessoal pelos professores acontece por se estar atraído por eles e se ter prazer por sua raça, sua aparência, pelo fato de que eles podem ser jovens, ou algo efêmero ou superficial em sua personalidade.

Em segundo lugar, é possível confundir apego por bondade genuína e compaixão. Amor e compaixão se distinguem de apego quando são igualmente aplicados aos seus amigos e seus inimigos. O amor genuíno e compaixão não fazem distinção com base na sua relação com o objeto de compaixão. Eles são o desejo de que todos os seres sencientes, sem exceção tenham a felicidade e as causas da felicidade, e o desejo de que todos os seres sencientes, sem exceção, sejam livres do sofrimento e das causas do sofrimento. A tônica dessas duas atitudes é que não há nenhuma esperança envolvida de qualquer natureza de retorno ou qualquer tipo de satisfação pessoal como resultado da felicidade dos outros.

No caso do apego por alguém, você deseja o bem a essa pessoa, mas ele está baseado em uma identificação com ele ou ela como “meu amigo, meu filho, minha filha”. Essa identificação e sentimento de propriedade ou de territorialidade estão relacionados com querer algum tipo de retorno. Você desfruta da felicidade dessa pessoa por ter uma identificação com ele ou ela, e, portanto, em essência, é apenas o desejo para seu próprio benefício. Tal apego pode muito facilmente se transformar em aversão, raiva e ódio. Esta é a diferença entre a compaixão e o apego.

Terceiro, é possível confundir a natureza vazia de todas as coisas com a vacuidade conceitualmente imputada. Isto é, podemos confundir a vacuidade genuína com uma ideia de vacuidade. A vacuidade genuína, a verdadeira natureza de todas as coisas, está além de qualquer tipo de elaboração, significa que está além de qualquer tipo de descrição ou apreciação conceitual. Ela não pode ser encontrada através do pensamento. Portanto, quando pensamos sobre a vacuidade e geramos um conceito ou ideia sobre isso, tudo o que podemos fazer é negar aspectos da nossa experiência e chamar essa negação de vacuidade. Não há nenhuma experiência direta da vacuidade em tal raciocínio. Raciocínio pode ser útil, mas não pode levar a uma experiência direta da própria natureza. Ele só pode conduzir à negação parcial de conceitos errôneos. A vacuidade verdadeira transcende não só a existência ou a afirmação da existência, mas também a não existência ou negação da existência. A vacuidade é inconcebível e, portanto, deve-se distinguir de uma ideia conceptual dela.

Em quarto lugar, é possível confundir o domínio dos fenômenos, o dharmadhatu, e a visão niilista. Porque o dharmadhatu é a natureza de todas as coisas, ele transcende o fato de ser uma coisa interdependente. Não é ocasionado por causas e condições. Não é um produto e não é um fenômeno composto. Isto é muito diferente da visão de que não há interdependência e, portanto, nenhuma continuação dos resultados produzidos por nossas ações presentes e passadas. É possível confundir estes dois. Algumas vezes, quando a natureza do dharmadhatu é apresentada, o entendimento parcial dessa natureza pode levar ao equívoco de que não há algo como karma.

Houve uma vez um mestre eminente, um nascimento anterior do Dodrupchen Rinpoche, que deu um ensinamento no qual expôs sobre o dharmadhatu. Um dos monges presentes entendeu mal a visão do dharmadhatu e pensou que isso significava que não havia resultados das ações e que era permitido fazer qualquer coisa. Ele saiu e matou uma cabra. Então Dodrupchen Rinpoche perguntou-lhe: “Você é uma pessoa do Dharma e um monge, como você poderia matar uma cabra?” Ele respondeu: “Você disse que eu não existo, a cabra não existe, e o ato de matar não existe. Portanto, pensei que não haveria nenhum problema.” Dodrupchen Rinpoche estava tão angustiado pelo fato do seu ensinamento ter levado a tal mal-entendido que ele entrou em retiro e não ensinou durante anos.

Quinta estancia, é possível confundir experiência e realização. Uma variedade de experiências pode surgir durante a sua prática. São indícios de que a prática é bem sucedida e está surtindo algum efeito sobre você. Tais experiências, tais indicações ou sinais são bastante diferentes da realização. As experiências por sua própria natureza decaem e desaparecem, enquanto que a realização não se desfaz e não pode desaparecer. Se você se fixar em uma experiência e direcionar sua prática em direção a ela, quando a experiência desaparecer você vai ficar sem nada, e certamente sem nenhuma realização.

É muito comum que as pessoas confundam estes dois. A diferença é extrema porque na realização todos os defeitos foram abandonados e o poder da sabedoria expandiu-se ou floresceu. É bastante comum para pessoas que têm algumas experiências durante a prática, assumir que atingiram realização. Eles assumem que são siddhas, e, portanto, se envolvem em condutas que eles ouviram que são apropriadas para siddhas. Então, é claro, quando eles morrem, vão para os reinos inferiores.

Em sexto lugar, é possível confundir um bom monge ou monja por um falso. Bons monges e monjas abandonam o que é prejudicial para si e para os outros, e cultivam o modo de conduta prescrito no Vinaya ou disciplina. A maneira como monges devem aparecer também é determinado: há determinadas vestes que são usadas de maneira particular, certas cores, certos implementos que são mantidos, certas coisas que são abandonadas, e assim por diante. Isto é muito detalhado, e um bom monge ou monja manterá tudo isso. Um falso pareceria o mesmo por fora, usando as mesmas vestes, e pareceria exatamente igual na conduta, se você apenas olhasse para ele ou ela. A diferença é que um bom monge ou monja se comporta da mesma maneira se alguém está ou não olhando. Ele ou ela é o mesmo em público ou privado. Um falso é sempre muito bom quando os outros estão olhando, mas quando ninguém está olhando, não é tão bom.

Sétimo, é possível confundir alguém que, tendo realizado manifestadamente a natureza de todas as coisas, erradicou toda confusão, com alguém que foi levado por Mara e enlouqueceu. Quando as pessoas realmente perceberam diretamente a natureza de todas as coisas, finalmente, elas não têm medo. Não têm medo de nada. Não têm nenhuma hesitação. Não têm necessidades pessoais; não se preocupam absolutamente consigo. Portanto, a maneira como eles podem agir é bastante incerto. Nós não podemos dizer que eles vão agir de uma forma ou de outra. Por outro lado, a forma de agir de alguém que ficou louco porque algo deu errado em sua prática poderá ser igualmente incerta. Não se pode realmente dizer a diferença do nosso ponto de vista.

Oitavo, é possível confundir um siddha e um charlatão. Tendo realizado completamente a natureza de todas as coisas e purificado todas as contaminações, os siddhas fazem uma variedade de coisas para o benefício dos seres sencientes. Por exemplo, eles podem fazer previsões. Siddhas podem dizer que daqui a vinte anos tal e tal coisa vai acontecer. As pessoas acham que as ações dos siddhas são bastante úteis e agradáveis; é útil saber dessas coisas. Por conseguinte, há também charlatães que, vendo que as pessoas acham os siddhas muito atraentes, fingem ser siddhas e fazem previsões – dizendo o que vai acontecer daqui a vinte anos, e que no passado certas coisas aconteceram e assim por diante, a fim de ganhar louvor e ficar ricos. Assim, é possível confundir siddhas e charlatães.

Nono, é possível confundir alguém que está envolvido em benefício de outros com alguém que está envolvido em seu próprio benefício. Bodhisattvas e iogues realizados irão fazer tudo o que puderem para beneficiar os seres sencientes com o seu corpo, fala e mente. Eles produzem um grande número de benefícios, e dedicam todo o mérito acumulado do bem que fazem a todos os seres sencientes. Eles não têm nenhuma esperança de qualquer tipo de resultado ou ganho pessoal através do bem que fazem.

Por outro lado, há pessoas que fazem uma quantidade de boas ações com o fim de atrair seguidores, ganhar riqueza e poder. Por exemplo, houve uma vez um lama tibetano que foi para Ladakh. Ele não era muito conhecido, então não tinha muitos seguidores e não recebeu muitas oferendas. Quaisquer que tenham sido as oferendas que recebeu, as usou para oferecer lamparinas e fazer oferendas de festim e assim por diante, com o proposito de acumular mérito. Quando as pessoas ouviram falar sobre isso, ficaram muito impressionadas com ele, a coisa era evidentemente real, então começaram a fazer um monte de oferendas para ele. Uma grande quantidade de pessoas reunidas em torno dele, uma cidade inteira de alunos. Desta forma, acumulou muito dinheiro a ponto de ir direto de volta ao Tibet. Foi um investimento calculado ao fazer pequenas oferendas iniciais. Ele sabia o que estava fazendo, que tudo o que oferecia estava indo para o campo de méritos, as pessoas poderiam oferecer muito mais, ele poderia simplesmente pegar o dinheiro.

Décimo, é possível confundir um professor habilidoso com um enganador ou professor desonesto. Professores hábeis fazem o que podem e dizem o que é necessário para possibilitar que as pessoas entrem na prática do Dharma e para ajudar seus alunos a evitar dificuldades e obstáculos desnecessários. Um professor que faz isso é um professor muito útil e excelente. Professores genuínos desse tipo não têm nenhuma preocupação com qualquer tipo de benefício que virá para eles. Eles não têm fixação sobre o que acontece e não há expectativa no que diz respeito à atitude dos seus alunos em relação a eles.

Por outro lado, há pessoas que agem de maneira um tanto similares, pelo menos na aparência, mas escondem seus próprios defeitos e fingem ter qualidades que eles realmente não possuem. Usando desse engodo, eles manipulam as pessoas para realizar algum tipo de intenção própria, tais como a aquisição de riqueza ou seguidores, ou ambos. É possível confundir estes dois tipos de professores.

Estas são as dez situações em que duas coisas têm a mesma aparência em primeiro lugar, mas não são, de fato, o mesmo.