A Preciosa Guirlanda 16 – Cap 15 As onze coisas indispensáveis

  1. Inicialmente, uma firme confiança reforçada por um grande medo da morte e do renascimento é indispensável;
  2. É indispensável ter um bom Lama para conduzir-nos ao caminho da Liberação;
  3. O conhecimento que permite a compreensão do Dharma, é indispensável;
  4. O ardor à prática, sustentado pela coragem e pela resistência, é indispensável;
  5. Cultivar sem complacência as duas acumulações e a prática das três instruções é indispensável;
  6. O ponto de vista justo que permite realizar a natureza essencial de todo objeto de conhecimento é indispensável.
  7. A meditação na qual a mente permanece onde é colocada é indispensável.
  8. Um modo de vida no qual todos os atos são integrados à prática é indispensável.
  9. Praticar as instruções que permitem combater os riscos de erro, condições adversas, obstáculos e demônios, para que elas não permaneçam letra morta, é indispensável.
  10. Ter adquirido a certeza que permite morrer sem medo, no momento em que a mente se separa do corpo, é indispensável.
  11. Obter o resultado da prática – os Três Corpos Espontâneos de Budha -, é indispensável.

 

As onze coisas indispensáveis – Comentários de Khenkpo Karthar Rimpoche

Em seguida, estão as onze coisas sem as quais não há como praticar o genuíno Dharma.

Primeiro, se você não possui desde o início de sua prática a fé estável ou a confiança que vem do medo sincero e genuíno dos sofrimentos do nascimento e da morte, não há como praticar o Dharma. A única coisa que pode motivar uma prática correta do Dharma é esse reconhecimento da miséria do ciclo contínuo de nascimento e morte. Somente por meio desse reconhecimento você pode ter uma confiança estável em um autêntico mestre e em suas instruções, e só com essa confiança que você pode realmente vir a compreender e praticar o Dharma.

Em segundo lugar, mesmo que você tenha uma confiança muito estável, não há uma maneira de praticar o Dharma sem um guru autêntico que realmente possa direcioná-lo no caminho que levará à liberação.

Em terceiro lugar, embora tenha o tal professor, se você não tem a percepção do que é a correta compreensão do significado do Dharma, então não há como praticar.

Quarto, mesmo se tiver uma compreensão genuína sobre o significado do Dharma, se não possuir a diligência que combina um compromisso como uma armadura e inabalável com uma genuína coragem, não há como praticar. Armadura, aqui, significa o comprometimento consigo mesmo, tão forte que a partir do inicio da prática não importa o que aconteça ou quanto tempo passe (tenha passado), você nunca vai se afastar da prática diligente.

Em quinto lugar, se você tiver a atitude na qual qualquer que seja a prática dos três treinamentos em reunião com as duas acumulações que você tenha feito é suficiente, não há nenhuma forma de praticar o genuíno Dharma. Você nunca pode estar satisfeito com a quantidade que tenha feito. Como mencionado anteriormente, os três treinos são a disciplina pessoal, a meditação, e a aquisição de conhecimento ou compreensão correta, e as duas acumulações são o mérito e a sabedoria. É importante nunca se contentar com qualquer medida desses treinos e acumulações que você tenha realizado.

Por exemplo, é impróprio se, tendo terminado a cem mil oferendas de mandala, pensar; “Isso é mérito suficiente, eu posso parar aqui”, ou tendo recitado o número prescrito de mantras, se pensar, “Isso é suficiente.” Na verdade, seu objetivo não é apenas terminar uma determinada prática ou acumular certo número de mantras, mas obter a total onisciência da budeidade completa. Pensar: “Este tanto é o suficiente, eu fiz o suficiente”, é tão tolo quanto para alguém que decidiu “Eu vou andar daqui até aquela cidade”, caminhar dez passos, ou uma centena ou mesmo milhares de passos, e então dizer: “Bem, isso basta.” Até chegar lá, até terminar o que você está tentando fazer e cumprir o seu compromisso, não será suficiente.

Em sexto lugar, se você não tiver a visão do que é a correta compreensão da natureza de todas as coisas, então não há nenhuma forma de praticar. A fim de alcançar o fruto da prática do Dharma é necessário compreender e apreciar a natureza de todas as coisas. Especificamente, devemos compreender o fato de que a sabedoria e as qualidades da fruição estão espontaneamente presentes na base, que é a nossa situação no momento. É somente devido a presença de tanta sabedoria e qualidades que é possível remover os obscurecimentos habituais e aflitivos que se escondem. Portanto, é só através dessa visão que podemos entender como o fruto pode ser obtido, e de como podemos obtê-lo.

Se não temos essa visão não vamos realmente compreender que defeitos devem ser evitados, que qualidades irão surgir, e como eles irão aparecer no caminho. Não saberemos que direção seguir na nossa prática. Seremos como pessoas caminhando de olhos vendados em direção a um destino desconhecido. Não interessa quão vigorosamente elas caminhem, não terão nem ideia aonde estão indo, então elas nunca chegarão. Se você tem essa visão e compreensão corretas, então, mesmo se seus passos no caminho são vacilantes, poucos ou lentos, você sabe onde está indo. Seus olhos estão abertos e você vê seu destino, então, no fim você chegará.

Em sétimo lugar, se você não possui a meditação que é a habilidade de colocar a mente em qualquer forma e em qualquer objeto que deseja, não há nenhuma forma de praticar. O desenvolvimento da tranquilidade ou shine é absolutamente necessário para o desempenho de qualquer tipo de prática. Se você possui certo grau de tranquilidade, você pode visualizar divindades e manter essa visualização, lembrando todos os detalhes de sua aparência. Pode recitar mantras e direcionar sua atenção a cada sílaba do mantra visualizado. Mesmo se estiver executando atividades mundanas, será capaz de executá-las com plena consciência e atenção, de modo que tudo o que fazemos se torna fácil e é realizado de forma eficaz. Finalmente, quando você chegar a reconhecer a natureza última, você será capaz de descansar nela, sem distração. Como foi dito pelo Grande Senhor Tsongkhapa, você deve ter essa tranquilidade que quando sua mente está em repouso é imóvel como o rei das montanhas, e quando você movê-la poderá entrar imediatamente em qualquer ato virtuoso.

Em oitavo lugar, sem possuir a conduta que traz todas as suas atividades para o caminho, não há maneira de praticar o Dharma. O significado geral de tal conduta é que tudo que se faz é realizado com a motivação, aspiração, atitude e percepção virtuosa. Por exemplo, quando os praticantes estão subindo uma montanha gerariam a aspiração, “Que todos os seres sencientes ascendam o caminho para completa liberação.” Quando estão descendo, eles pensam: “Que todos os budas emanem do dharmakaya na forma de um corpo, trazendo a todos os seres sencientes à liberação.” Caminhando ao longo de uma estrada, eles pensam: “Que todos os seres sencientes percorram o caminho correto e adequado, sem obstáculos.” Quando acendem um fogo, eles pensariam, “Que o fogo da sabedoria queime as impurezas de todos os seres sencientes.” Todas essas motivações e práticas relacionadas com as atividades diárias podem ser encontradas nos sutras do mahayana. O significado particular com respeito ao mantra secreto é que ao longo de todas as atividades você deve manter a consciência de si mesmo como a divindade, o som como mantra, e todos os eventos mentais como a manifestação da sabedoria. Através de tal conduta tudo que você faz torna-se significativo e é trazido para o caminho.

 

Em nono lugar, a menos que você receba e realmente implemente as instruções que lhe permitem superar os obstáculos na prática, não os deixando como meras palavras – não há maneira de praticar com sucesso. Isso se refere às instruções que lhe permitem superar impedimentos e condições adversas, transcendendo a sedução de Mara, reconhecendo e evitando fontes de erro ou corrupção na prática. É especialmente importante que, ao receber tais instruções, realmente as coloque em prática. Deixar as instruções como meras palavras significa receber instruções de um professor, memorizá-las e repeti-las para os outros, mas nunca fazer qualquer uso delas.

Em décimo lugar, não há maneira de atingir o resultado ou fazer uma prática significativa sem possuir a grande confiança que o fará feliz no momento da separação da mente e o corpo. A grande confiança vem de fazer bom uso da oportunidade de praticar. Quer dizer que, tendo obtido um precioso corpo humano, exercitou-se em ouvir, contemplar e meditar, realizou direta e indiretamente benefício aos outros, adquiriu e usou um caminho puro. Como você tem a confiança que vem disso, caso morra em qualquer momento, o que pode acontecer, a possibilidade não o atemoriza. Isso é semelhante ao sentimento de alguém que pode ser exilado a qualquer momento de seu país ou de sua residência, mas sabe que no lugar de exílio há amigos, bens e dinheiro que pode ser usado para sobreviver. Essa pessoa não está preocupada realmente com o que irá acontecer.

A melhor forma de confiança vem da Realização do Mahamudra, nesse  caso você sabe que quando morrer, a clara luz do caminho – a realização que você conquistou através de sua prática – irá se misturar com a clara luz base, que é fundamentalmente a presença dessa clara luz que surge na consciência de alguém que acaba de morrer. Sabe se que estes irão se misturar da mesma maneira que um filho pulando no colo de sua mãe, e quando isso ocorre, você alcançará de imediato o estado de unidade, o estado de Vajradhara.

Se você não tem essa certeza, então como a seguinte melhor forma, é suficiente ter a confiança estável que você tem feito o seu melhor na acumulação de mérito e sabedoria, e que, portanto, nada pode dar errado quando você morrer. Gerar essa confiança de que no momento de sua morte você está seguro é o ponto do Dharma.

Por fim, não há um modo de praticar o genuíno Dharma sem ter a fruição, que é a presença espontânea, dos três corpos dentro de nós. A visão em que o caminho da prática está baseado é a compreensão da natureza de todas as coisas. Enquanto as coisas possuem uma existência não inerente e, portanto, é dito que são vazias, há uma lucidez que caracteriza nossa experiência e há, ao mesmo tempo, uma variedade desimpedida ou ilimitada daquilo que experimentamos.  Essa é a forma como as coisas são e através do processo de ter essa natureza apontada no momento da instrução que ela é compreendida. O reconhecimento dessa natureza é o ponto de partida e a base para o caminho, que é a familiarização com essa natureza. Isto leva ao resultado, que é a manifestação da vacuidade de todas as experiências como o corpo das qualidades essenciais ou dharmakaya; a manifestação da lucidez inerente como o corpo de completo deleite ou sambhogakaya; e a manifestação do estado desimpedido como o corpo da emanação ou nirmanakaya, o qual emana em uma variedade ilimitada de formas para o benefício de todos os seres sencientes da maneira que seja apropriada para cada situação em particular.

É necessário entender que o resultado da prática não é algo que acontecerá automaticamente, devido a fruição ser diferente de nosso estado presente, mas também não é algo novo, porque a natureza da fruição é nossa natureza nesse momento. O fato que isso é algo novo e ao mesmo tem não é, está indicado pelo termo “presença espontânea”. Podemos dizer que a fruição é algo novo porque nesse momento não experimentamos os três corpos da completa budeidade. Eles estão obscurecidos pelos véus casuais que nos afetam desde  os tempos sem começo . Por outro lado, não podemos realmente dizer que a fruição é algo novo, porque o que realmente são os três corpos são está presente em nós e está simplesmente obscurecido. A fruição consiste no reconhecimento em nós dos três corpos e a remoção resultante dos obscurecimentos.

Essas são as onze coisas sem as quais não há nenhuma forma de praticar o Dharma genuíno.