A Preciosa Guirlanda 24 – Cap 22 As Dez Coisas Indispensáveis
Essas são as dez coisas indispensáveis:
- No início, a fé genuína que surge do medo do nascimento e da morte é indispensável, como a atitude de um cervo que fugiu de uma armadilha;
- No estágio intermediário, é indispensável uma diligencia tal que, quando chegar o momento da morte, não haverá razão para arrependimentos, como a atitude de um fazendeiro na colheita;
- No final, uma mente feliz que não pode morrer é indispensável, como a atitude de uma pessoa que completou um grande esforço;
- No início, um reconhecimento de urgência é indispensável, como alguém que foi traspassado por uma flecha;
- No estágio intermediário, a meditação sem distrações é indispensável, como os intensos sentimentos de uma mãe cujo único filho morreu;
- No final, o reconhecimento de que não há nada a fazer é indispensável, como a atitude de gado libertado por ativistas;
- No início, a geração de certeza em relação ao dharma é indispensável, como o sentimento de uma pessoa faminta que encontra boa comida.
- No estágio intermediário, a geração de certeza em relação à própria mente é indispensável, como a atitude do lutador que adquiriu a jóia;
- No final, a geração de certeza para a não-dualidade é indispensável, como a exposição da fraude de um impostor;
- A resolução de se estabelecer na talidade é indispensável, como um corvo voando de um navio.
As dez coisas indispensáveis – Comentários de Khenpo Karthar Rinpoche
Primeiro, no começo, você precisa ter a fé genuína e sincera baseada no medo dos sofrimentos do samsara, como o nascimento, a morte, e assim por diante, como a atitude de um cervo que escapou do poço preparado pelos caçadores.
Segundo, no estágio intermediário, ao praticar, você precisa ter o tipo de diligência que o deixará sem culpa ou medo no momento da morte, como a atitude de um fazendeiro na época da colheita.
Em terceiro lugar, no final, você precisa ter uma mente feliz que não pode morrer, como a atitude de alguém que acaba de realizar algo incrível.
Em quarto lugar, no início, você tem que ter um senso de urgência, como alguém que acaba de ser atingido por uma flecha. Ao ser atingido, você não pensa: “Talvez antes de puxar esta flecha para fora, eu vou tomar uma xícara de chá”, ou qualquer coisa assim.
Em quinto lugar, no estágio intermediário, tem que se ter uma meditação totalmente sem distrações, como a tristeza de uma mãe cujo único filho acaba de morrer. Essa mãe só pensa em sua tristeza noite e dia.
Sexto, no final, você tem que ter um reconhecimento de que não há nada para fazer, como o gado libertado do seu confinamento por ativistas. Quando as pessoas possuem gados, é claro, estão sempre as ordenhando, fazendo isso ou fazendo aquilo, o gado tem um monte de trabalho e aborrecimentos. Quando os ativistas quebram as barreiras do seu confinamento, o gado pode vagar ao redor, tendo uma sensação da liberdade e de liberação.
Sétimo, no começo, você tem que ter uma certeza em relação ao dharma como a de uma pessoa muito faminta que encontra excelente comida.
Oitavo, no estágio intermediário, você tem que ter uma certeza sobre sua própria mente como a de um lutador quando achou a joia. Isso se refere a uma fábula, uma história que é simbólica: uma vez havia um lutador cuja família tinha lhe dado um diamante, que sempre usava na testa. Ele acabara de ganhar um combate de luta livre, no qual ele e o outro lutador haviam sido espancados e tinham feridas e inchaços em seus rostos e cabeças. Ele não estava nem um pouco perturbado com suas feridas, mas sim por não conseguir encontrar sua joia, achou que a tinha perdido. Ele estava tentando encontrá-lo, olhando ao redor do poço de luta, mas ele não poderia encontrá-lo em qualquer lugar. Então ele foi a um médico, que disse: “Você tem um monte de ferimentos. É melhor eu começar a trata-las.”
O lutador disse: “Eu não me importo com isso! O que me importa é que eu perdi o diamante da minha família.” Mas o médico insistiu em olhar para as feridas, e notou especialmente um inchaço na testa com grande ferimento. O médico perguntou: “Agora, como você perdeu esse diamante?” E o lutador disse: “Bem, eu estava lutando com ele na minha cabeça”.
O médico olhou dentro do inchaço e descobriu que o diamante tinha ficado preso sob a pele. Ele disse ao lutador: “Aqui está o seu diamante”. O lutador estava muito feliz, afinal, descobriu que não tinha perdido o seu diamante. Sua procura fora para ele tinha sido sem sentido, porque o diamante não estava fora, estava dentro e escondido. Este ponto refere-se a ter a certeza de que as qualidades a serem realizadas são encontradas dentro da mente e não devem ser procuradas fora dela.
Essas pequenas fábulas são bastante comuns nos escritos do Gampopa, e também em algumas das canções que Milarepa cantou para Gampopa, e pode ser encontrada na “Chuva da Sabedoria”[1].
Em nono lugar, no final, você tem que gerar uma certeza sobre a não-dualidade, que é como expor a fraude de um impostor. É preciso cortar totalmente a falsa imputação da dualidade do experimentador e da experiência, ao determinar que todas as experiências não são estabelecidas como tendo outra natureza que não a própria experiência em si.
Décimo, é necessário estabelecer-se firme na talidade que é como um corvo voando livre de uma gaiola ou navio. Quando um corvo sai de uma gaiola ele nunca mais voltará. Além disso, quando um corvo voa de um navio no meio do oceano, ele sempre retornará ao navio. O primeiro significa que, uma vez estabelecido na talidade, não se volta mais à confusão.O significado do segundo é que essa determinação gera a certeza de que os pensamentos que surgem, por serem a expressão da própria talidade, acabam a ela retornando.
Estas são as dez coisas que são necessárias.
[1] The rain of Wisdom, tr. Pelo Nalanda Translation Comitee, Boston: Shambala, 1989.